05 novembro 2007

Lago


Você é todo lago.

Todo olhos transparentes,

corpo morno,

balanço suave...


Lago onde me largo, estreito corpo em suas águas sem fim.




Primeiro do Coletivo:

23 outubro 2007

Fotografia

choveu,

e eu não estava em casa.

a água molhou tudo.



aquela foto bonita da nossa viagem à bahia.

ficou boa assim, uma bahia desfocada, manchada, chorada.

talvez tenha saudades nossas, talvez não lembre nossos rostos.

eu agora entendo que precisamos nos ver outra vez,

mas tem que ser na bahia.

e dessa vez não vou tirar foto alguma

que minha memória, temporal nenhum mancha,
só o tempo...


Postado no Coletivo:
http://chotexpro.blogspot.com/

09 outubro 2007

leminski


vou tocando com os dedos abertos cada palavra rude que me sobrou.

faço todas dançarem ao som do blues.

se eu fotografasse e te mandasse, você veria um poema do leminski.

Da minha Flor


Lá longe onde ela está,

o dia amanhece com as cores e os sons do inédito.


Aqui ao meu redor tudo dormente,

com cara de rotina.


E meu dia a esperar por ela.

carente de suas caretas,

ansiando por suas risadas engraçadas,

querendo seu jeito bonito de flor.


Tudo a esperar por ela e suas muitas formas de me fazer feliz.

26 setembro 2007

Varandas de Nanquim

Eu desenharia a nanquim as telhas daquele beiral,
meio tortas, com partes cobertas de musgo.

E descendo pela trepadeira da parede,
eu desenharia também os olhos vazios do velho da varanda.
E sua cadeira de vime, e suas mão pintadas.
E minha pena ia contar a ele histórias de outras varandas que ele não lembra mais.

Lajotas de barro

estrada de lajotas de barro
geladas na sombra
quentes no sol

as lajotas sabem conversar com o céu

24 setembro 2007

Em cima daquele morro tem uma antena.
Na antena bate de leve o sol pálido de quase dia.
Faz uma sombra engraçada.
Eu me lembro de ir dormir.

Brisa


Vem daquela fresta entre as persianas,

um outro tanto entra por debaixo da porta empenada.

Também sopra pelos canos enferrujados e aflora pelos ralos afora.

Eu? Finjo que não vejo...

tapo me toda em escuridão.


Mas no piso da sala vai se formando um redemoinho...

18 setembro 2007

Antigo


é antigo,

tem a idade do erro

tem o gosto do mofo

e anda a perguntar de ti


é antigo,

guarda um som abafado

um suspiro pesado

e dorme dentro de mim


16 setembro 2007

Embora eu saiba que não pode ser...
Embora eu saiba que já não da pé...
seu cheiro em mim,
desde que fui embora.

09 setembro 2007

Véu

da boca aberta da noite
escorria o amargo e frio
véu que tudo cobria

05 setembro 2007


Você toda me olhava,

fingia que não.

Mas seu corpo conversava comigo,

seu colo moreno me dizia: "ai moço, há quanto tempo..."

suas coxas me chamavam: "te tenho saudades..."

até sua boca, sem quereres, me provocava entreaberta me mostrando a língua.

Ah você que não sabe mais se ouvir...

08 agosto 2007

Refresco

E de mais a mais, sabia que o dia ia chegar em que o medo iria embora.
E ia levantar-se com sua roupa em trapos, e sua cara cansada de medo de tantos anos e faria um aceno quase solene e seguiria lento para atrás das cortinas.
E enquanto ela esperava a derradeira cena, se distraía tomando um refresco amargo feito de coisas desfeitas.

O primeiro dia


E de manhã, ao olhar para o céu com os olhos ainda cobertos pelas etéreas mãos do sono, viu o azul inédito dos dias seguintes.

Um azul que ela ia desvendando ainda com um certo medo, sem saber todo seu. Mas que já estava entrando por ela, ali por onde ela esquecera de se trancar a chaves, colorindo a toda por dentro.

Inaugurou seu azul com um sorriso largo de quem reconhece o início do resto de tudo.

07 agosto 2007

Chamava


Por olhá-la assim sorrindo, a chamava de menina,

Por sabê-la tão doída, a chamava de meu anjo,

Por achá-la assim tão livre, a perdia no horizonte...
Vou fazer aquilo que deveria,

e deve ser fácil, pois assim me disseram:

"melhor agora, pior depois"



depois piora, depois engasta, depois entala.

eu ja sabia.



com a boca aberta de salvar o dia,

perco a hora
Tinha essa coisa de ele falar e fechar de leve os olhos, pálpebras de borboletas.
E de suave correr a mão onde ela era bem vinda.
Tinha também o jeito manso de medir as pausas da fala morna.
E isso tudo morava num lugar frio chamado lembrança.

O corpo cheio de estrelas...

Na manhã que canta,
tanta coisa a desabar sobre os homens...

Mas quando a gente quer saber o tamanho do vazio, a gente enche ele de coisas, e cabem tantas dentro de mim...

Memórias e esquecimentos


Lapsomoço pergunta à Mnemomenina:

_Por que mesmo que não deu certo?

21 julho 2007


balanço as pernas aqui sentada na borda do tempo

e olho a vida passar nas brancas nuvens de formas engraçadas



19 julho 2007

Esquina


Era aquele o pouco luxo que se dava por dia.
No dia confuso, sob o sol das tardes de aquecimento global que franzia cenhos pela cidade, nas ruas caóticas, barulhentas e vazias de gentilezas, ela ia se equilibrando sobre o par de scarpins. Belos e torturantes sapatos, que combinados com a meia de nylon, a deixavam mais séria, mais sóbria, mais exausta.
No pulso, os ponteiros finos e dourados delatavam seu atraso, de minutos perdidos em coletivos lotados, de horas perdidas em devaneios atropelados. Chegava a pensar se tanto tempo perdido ia parar em algum lugar, somar-se a outros tempos perdidos de outras pessoas que devaneavam em algum coletivo lotado na volta pra suas casas em periferias pelo mundo...
Na meia hora por dia que tinha para almoçar um sanduíche, comprar remédio pro filho, pagar contas, ler o horóscopo de pé na banca, fazer as unhas e pensar em como a vida podia ser melhor, ela passava naquela esquina para encontrar com ele.
E ao ir caminhando em direção a ela, ia se esquecendo um por um os itens da lista de tarefas que não daria conta de fazer. E via as palmeiras do aterro e o obelisco da Rio Branco recortados sobre céu de azul cobalto, e sentia cheiro de mar.
Nessa hora ela caminhava devagar e sabia que ele estava chegando, às vezes correndo, às vezes com vagar, mas ele vinha e ela o esperava. Desacelerava o passo, lançava as pernas no ar quase em câmera lenta. Já sentia seu cheiro atrás de si quando virava a cabeça e fazia dançar no ar suas ondas dourado-médio de farmácia.
E ele vinha alcançá-la e a abraçava com a ternura e a saudade dos amantes incertos, fazia voar sua saia em ondulações performáticas e floridas, e o movimento da organza fina ia propagando ondas de eletricidade no ar que alcançava os transeuntes desavisados, os taxistas enfadados e os pedintes esfomeados. E a esses movimentos se seguiam outros quase tão ensaiados quanto, de virar de pescoços, espichar de olhos e cair de queixos.
E depois de transformar a sóbria secretária-recepcionista bilíngue em uma festa de cores e formas e cheiros e encantamento, ele seguia, virando outras esquinas, abraçando suas outras amantes, fazendo dançar outras saias...

você


você exercício de mim
você olhos, rasgos
você montes de palavras ditas, não ditas, espremidas entre nós dois
você medo
você braços e bocas e léguas de mim
você zumbido no ouvido
você som
você passos, e rodas e pés espertos
você frio

você barco, mergulho, mato
você saudade...

12 julho 2007

do que faltou


das mil coisas feitas, ditas e sonhadas faltou uma.


faltou dançar uma dança,

aquela de rostos colados e dedos entrelaçados,

aquela de respiração pesada e olhos apertados.

faltou que a dança fosse na rua,

não na praça ou na calçada,

mas bem no meio da rua.

e faltou que no meio dela chovesse.

e chovesse muito, e chovesse forte,

e a chuva açoitasse os dançarinos,

e caisse muita água,

água de lavar todo rancor da alma,

de molhar os nãos secos,

de lavar as horas embotadas de espera,

de liquefazer todas as dores e amolecer o peito duro.


de tudo que houve, faltou a chuva.

Ábaco


Olhava as riscas do lençol. E seus olhos se perdiam numa ilusão de óptica.

Lembrava que as linhas que viravam curvas a divertiam quando criança.

Hoje sabia que ilusões podem ser bem menos divertidas.

Olhava as listras como se nela fizesse seu ábaco, e nele fosse contando os dias, os meses, as distâncias, todos os números da sua prostração.

Em criança, nunca gostou de números.

05 julho 2007

Margaridas


Ela me vinha visitar às vezes.
Chegava no fim da tarde, surpreendendo a hora indecisa do dia.
Vinha com sua leveza.
Ela era leve,
Leve onde eu não lembrava mais que se podia.
E eu era tão pesada...
Ela trazia margaridas, que colocava sobre minha mesa, e mesmo depois de ela ir embora, as flores miúdas continuavam trazendo o inusitado daqueles olhos alegres.
E eu gostava de vê-la passeando pela casa, gostava do jeito que encostava de leve nas coisas, do jeito que caminhava fluida, e do seu vestidos de tons de céu.
E ela me mostrava coisas bonitas, foi ela quem nem mostrou a sombra das árvores na parede da sala ao cair da tarde, ela me ensinou a rir das paredes. Embora quando ela se vá eu não lembre direito como fazer.
Ela desenhava coisas com os dedos no ar, e os desenhos tinham a cor que ela escolhesse.
Ela era tranquila,
Tranquila onde eu achava que não se podia.
Eu era tão afobada...
Depois ela se levantava,
me fazia um carinho na face com a concha da mão.
E arrastava na barra do vestido todo o cheiro de sol que trouxera.
Ela descia as escadas cantando...

Roupa de baixo



Tira do armário empoeirado e veste.
Esse sorriso apertado, com cheiro de guardado, é tua roupa de gala.
Remenda se preciso, lavando fica novo.
E leva com graça...
Assim, ninguém há de perceber que a mágoa estampa sua roupa de baixo

04 julho 2007

Cafuné é aquela coisa que faz voar pra dentro de si mesmo.
O que mais impressionava não era a voz da cantora,
nem sua afinação, nem mesmo o tom.
Mas a forma como ela fechava os olhos serenamente ao emitir os agudos mais estridentes.
Como se com uma tesoura, se pudesse separar a boca que gritava dos olhos que adormeciam.

Infinitivo

dos verbos que eu escolhi pra enfeitar nosso lar,
sobraram poucos.
os mais bonitos eu levei comigo,
pra sair conjugando pela vida afora.
esses que eu deixo no seu jardim e sobre a mesa,
devem ficar assim mesmo.
sem complementos, no infinitivo.

hora muda


Agora era aquela hora muda,

de levantar e tentar não se encarar nos olhos.

E procurar sob a cama o sentido de tudo aquilo.

E fingir esse sorriso estreito, e tentar um olhar desfeito.


E ela ia me abrir a porta, e ia me dar um beijo,

na testa talvez,

e ia ensaiar qualquer volte sempre


o elevador me sorria cínico,

o porteiro me olhava crítico,

o sol me cozinhava aos poucos...

Lígia


Falavam sobre música, talvez sobre literatura, sempre sobre linguagem.


E Ligia acendia seu último cigarro.


Discutiam a mensagem, e canal, receptor.


Lígia era o ruído.


Eles, horas vazias a empilhar conceitos.


Ela, a análise simples.


E enquanto eles se perdiam nos meandros de teorias inventadas,


ela tomava um sorvete de menta.

23 junho 2007

serenar

o sereno é a chuva que cansou de cantar...

21 junho 2007

O pulo e a corda


Tentava imaginar que o movimento não tinha mistério algum, o ato de descrever um círculo com os braços e fazer girar a corda sobre a cabeça realmente não apresentava muita complexidade. Ela mesma, quando menina, já havia perdido manhãs e tardes nisso sob o caquizeiro, lembra ao sentir o cheiro do sisal molhado.

O grande feito estava, porém, no cálculo exato do momento do pulo.
Nem cedo demais, para não voltar a ter as cordas sob os pés,
Nem por demais tarde, para não ser açoitada pela aspereza da corda pesada.

Talvez se ela ensaiasse sem a corda... talvez se tentasse mentalizar o movimento antes de fazê-los, talvez se..., não adiantava, era preciso pular.

Segurou firme as duas pontas e arremessou a corda, fechou os olhos e pulou.
Logo saberia se o momento havia sido o certo.

20 junho 2007

Surda


E esse silêncio que as coisas têm às vezes?

Essa coisa de o mundo não querer mais se contar pra mim.

E eu ficar com cara de surda olhando a janela...

Tábua Corrida


Apagou a luz da sala, deixou apenas que o pálido facho que vinha do poste da frente iluminasse o chão de tábuas gasto.

Tirou os sapatos e os colocou no canto, virados contra a parede, não queria nem a eles como testemunha.

Olhou o cômodo escuro, as paredes nuas e mobílias rotas. Andou com os pés descalços a escrever círculos na poeira fina e fria.

E foi assim, com movimentos suaves, ensaiando uma evolução de passos e giros lentos pela sala. Tocando com os dedos abertos o ar úmido e denso que dançava contrariado arrastado por seu vestido.

Ela testava a dimensão do cômodo com o movimento do seu corpo e ia de encontro às paredes e descia por elas e subia novamente e voltava ao chão.

Agora ela podia fechar os olhos e dançar pra dentro, e de olhos fechados ela se via dançando, não naquela sala escura mas em uma sala clara sem tetos e sem paredes que a tocassem.

14 junho 2007

É coisa pouca o que te peço.


Peço-te que chegue em silêncio, me olhe de dentro de você e que me cubra dessa mansidão.
Peço também que respire calma e pesadamente aqui onde o pescoço encontra o ombro e onde a paz econtra a fúria.
Não te peço que me entendas, fica até melhor assim.
Mas peço ainda que me alise a face, e me beije de leve como me acordasse de um sonho ruim.
E por útlimo peço-te que saia como chegou, em silêncio, sem acender a luz, para não me ver aprendendo a te amar em sonhos.

13 junho 2007


No princípio ele estava lá, e ela o olhava com olhos mansos de alcançar.

E ele pegava sua mão, e ela ia (re)conhecendo pedaços dela nele.

E ia decorando seus contornos, aprendendo seus sons e seus gestos.

Ela ia pisando a areia marcada dos seus pés, medindo se ali cabia um pouco mais dela.



E ela era toda doação.

Ela era toda devoção.


ele era o vento...

12 junho 2007

saudade não dói tanto assim...



não sei que nome tem isso que não se parece com nada conhecido.
me tira do chão, me deixa suspensa e desamparada, me joga depois contra a parede.
se perde entre mil lembranças, me faz rir e me deixa zonza.
e vem o cheiro dela, e vem o som da risada, e vem a cor dos olhos...
e eu tento entender, tento explicar, fico muda...

é um querer ter perto
é um saber nunca mais
é um sofrer demais...

Hoje eu não vou


não vou 'bom dia',
não vou tropeçar no mesmo bueiro,
não vou olhar pros dois lados,
não vou escolher o mais barato,
não vou contar as moedas do troco,
não vou aproveitar pra jogar,
não vou comprar o jornal pra ler no balcão
não vou tomar um café forte,
não vou reparar a sujeira do bar,
não vou levantar e pagar a conta,
não vou caminhar lendo a manchete distraída,
não vou correr pra perder o ônibus,
não vou me espremer na roleta fria,
não vou ver a chuva fina no vidro,
não vou chegar afobada e atrasada,
não vou 'décimo, por favor'
não vou levantar a cada minuto pra um café ou uma água,
não vou olhar impaciente o relógio,
não vou levantar e dar um longo suspiro,
não vou 'até amanhã',
não vou me olhar triste no espelho sujo,
não vou descer correndo escadas molhadas,
não vou 'tenho não querida...'
não vou me espremer meu corpo contra outros vários corpos,
não vou 'boa noite'
não vou ter vontade de fazer xixi ao girar a chave,
não vou me jogar no sofá cansada.

pois nele ja estou, cansada

Sonhos


à noite ele escrevia coisas na sua sala
e pela manhã as paredes estavam vestidas de tinta...
assim ela conseguia adivinhar o que sonhara seu menino

11 junho 2007

Vem...


Vem no vento
vem pra mim
vem como quem já se vai
vem pra fazer falta
vem com a calma da manhã
e vem com a pressa da fome
vem pra chover em mim

vem e me traz junto

Textura




Depois daquela noite, passava os dias a correr os dedos sobre as superfícies todas buscando a mesma textura da pele quente daquela moça.
Procurou em outros corpos, em cada um dos tecidos das lojas, em cascas de frutas, em flores e em peles raras de animais idem, não encontrava. Não estava lá, nunca acharia...

Foi assim, que ao suspirar cansado, encontrou no cheiro que o vento trazia, toda a maciez e o calor perdidos naquela noite.

06 junho 2007

O mundo não tem cabimento!
E eu não caibo em mim...

O segredo da boa tostada...


Porque tem coisas no mundo que nunca vão mudar...

A lembrança do cheiro de caqui que vinha do quintal quando chegava o outono;

O gosto da cuca de banana da que a gente comia na rede da varanda;

O tom daquele vermelho desbotado do vestido de caipira que eu queria usar pra ir ao colégio todo dia...


O frio na barriga de quando você vinha em minha direção.

As horas que perdi vagando dentro do teus olhos mutantes.

Cada um dos cinco minutinhos topológicos de letargia a dois na cama dos elefantes.

A ternura que corria em mim quando na garupa da Olga eu colava meu corpo quente no da frente.

O tesão de te surpreender me olhando com olhos de menino.


Talvez seja esse o segredo da vida, como o da boa tostada, não medir em nada, ser assim abundante sentimento, ser vontade e ser fome...

05 junho 2007


Pelas ruas e becos da cidade eu esbarro nas pessoas que eu não sou. Que conversam com seus amigos que não me conhecem. Para os quais minha presença não diz nada.
E sigo assim, a tropeçar na vida que eu não levo.
Quem seria eu se fosse outro? Quanto de mim há na sóbria recepcionista que me fita? Qual parte desse pedinte faminto eu sou? O que dessa criança que ri cabe em mim?
Por onde vago em sonhos quando experimento ser você?

04 junho 2007

A moça e seu jardim


Sentada diante de mim, cruzava as longas pernas enquanto segurava o copo entre os dedos finos. Na outra mão, queimava esquecido um cigarro.

Usava pesados brincos que desciam pelo pescoço e balançavam caóticamente quando ela toda se ria.

Falava muito, e no seu falar tentava afogar o peso do meu olhar sobre seu colo.

Pensava que ao me contar suas mentiras ela ia me conduzindo pelas mãos ao largo de seu coração.

Era como uma criança nua, que ao tapar os olhos se pensa invisível.

Em um dado momento desistiu, se rendeu, deixou quietos os brincos e os olhos sobre os meus.

E entendeu que quanto mais devaneava, mais me escancarava o portão de seu jardim dos medos, neuroses e taras.

03 junho 2007

As quatro cores do dia


Hoje eu quero ser pra sempre cor.

De manhã escolho um verde pistache, que tem vida, que tem cheiro de mato.

Depois do almoço passo sem contrangimentos pra esse magenta escandaloso. Enérgico, libidinoso.

Meu fim de tarde é azul hortência, cor que me acalenta com cantorias antigas.

Mas enfim anoiteço sempre nos braços desse gris assustado, com cheiro de mofo e saudade.

02 junho 2007

a mim


eu me invento,

me refaço de vento

me tento, me provoco

me evoco há tempos.


eu tento, faço como posso

me provo, me tempero

me dispo, me entrego

me minto e me calo.


depois dia

depois brisa

depois eu


eu me desinvento

29 maio 2007

Lições sobre humildade


o pior não é falhar aos olhos dos outros,
mas decepcionar-se consigo mesmo.
deixar-me a desejar...
ver que as pernas não bastam.

e pra seguir?
querer quanto menos, tentar quanto mais?

a maior coragem é a coragem para falhar.

27 maio 2007

Isso não vai durar muito, eu sei!


O provisório que é eterno
Que tem tudo pra dar certo, mas nao dá.
Que é vontade pura, mas que passa.
Que tira o sono, mas dá preguiça...
Que começa prometendo e termina se desculpando.